Desde aquele último sorriso - o famoso divisor de águas - ela andava catatônica. As pessoas tentavam, a todo custo, descobrir todas as razões para as súbitas mudanças de humor, para a sua tendência ao isolamento. Não era como se ela tivesse transformado radicalmente a sua personalidade. Não. Apenas passara a perceber e sentir as coisas e pessoas de uma maneira diferente.
Sentia falta dos pequenos detalhes, mas, especialmente, do beijo de rotina, porque ele podia ser muitos beijos com o mesmo significado. Sem pressa, sem a paixão que cega e rouba o essencial. Era um beijo de puro sentimento, de amor. Tantas e tantas tardes de filmes independentes, muito doce e outros tantos beijos de ‘eu te amo’. Ela mal podia pensar sobre isso sem se encher de nostalgia e autopiedade.
O cara que ligava meia noite e um pra desejar feliz aniversário, que segurava seu dedo mindinho no supermercado, e fazia piada de tudo. Parte de um passado tão recente, mas, ao mesmo tempo, remoto. Por mais que tentasse se desligar dessas lembranças, sempre havia uma voz sussurrando como um fantasma insistente. Cenas que escorriam diante dos olhos, tão próximas que pareciam tangíveis.
Talvez as coisas estivessem fadadas, desde o início, a acabar como acabaram. Ela simplesmente se recusou a farejar os indícios. Agora ela percebia que as pistas estiveram por todos os lados. As ligações cada vez mais escassas, os olhares vazios e esquivos, as conversas forçadas. O fim da linguagem secreta que ninguém além deles dois seria capaz de decifrar.
Mas, mesmo com toda aquela saudade pungente, ela não se arrependia de nada. Arriscou tudo, aquilo era irrefutável. Então, que assim fosse. Que ele fosse a cicatriz eterna da certeza de que não era impossível se entregar.
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