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terça-feira, 17 de abril de 2012

O altruísmo puro


Eu sou uma pessoa facilmente tomada pelo encantamento diante do altruísmo. Do verdadeiro, do altruísmo puro. Daquele gesto no cotidiano de ceder o assento do ônibus a um senhor, de segurar a porta pra que alguém cheio de sacolas passe, de devolver algo que deixaram cair. Assisto a momentos como esses com um brilho no olhar, tenho certeza de que não disfarço muito bem. Porque, pra ser sincera, eu não espero isso das pessoas. Outro dia, numa manhã - madrugada - de chuva torrencial, enquanto eu esperava no ponto de ônibus, vi uma cena que me marcou. Uma mulher, trazendo uma criança de colo, tentava precariamente descer do ônibus e abrir o guarda-chuva, tudo ao mesmo tempo. Do meu lado, um rapaz de mochila e havaiana, estudante universitário como eu, correu até a porta do ônibus e abrigou a mulher e sua criança sob o guarda-chuva dele, deixando-se molhar. Ele acompanhou as duas até que estivessem protegidas debaixo do abrigo em que todos nós estávamos.

Apenas tardiamente eu notei que estava sorrindo. O rapaz olhou pra mim e devolveu o sorriso, mas não como se dissesse 'eu sei, sou um bom samaritano'. Não, ele sorriu de volta porque era um amor de pessoa mesmo. Ainda ficou um tempo conversando com as duas antes de pegar o próximo ônibus. Daí eu fiquei pensando que aquele momento marcou o meu dia. Engraçado, mas eu realmente me senti feliz. Verdadeiramente feliz, porque nem aquela chuva pesada, nem as pessoas aborrecidas com aquela água toda, com as roupas molhadas, as chapinhas arrasadas, nada poderia me irritar depois daquilo. Ainda existiam pessoas altruístas por natureza no mundo e isso era digno de um sorriso e uma postura positiva diante da vida. 

Eu gostaria de ver mais cenas como essa, porque elas me renovam, elas me devolvem o privilégio de acreditar nas pessoas, na sua bondade, na parte boa que sobrevive nelas mesmo num mundo tão cheio de trapaça, desonestidade e grosseria. Ver esse tipo de cena reduz minha carranca, relaxa meus músculos rijos, baixa minha guarda um pouco. Porque todo dia eu visto minha máscara, como todo mundo. A máscara da desconfiança, do distanciamento e do desinteresse.

Assistir ao altruísmo alheio tanto quanto praticá-lo você mesmo faz bem à saúde. Eu acredito nisso. Por isso, se não posso ser presenteada diariamente com um gesto de bondade, generosidade, posso praticá-lo eu mesma. Já compreendo que com uma atitude aparentemente irrelevante de tão pequena e rotineira, eu posso melhorar o dia de alguém, posso presentear alguém com o mesmo encantamento rejuvenescedor que tanto valorizo.

domingo, 8 de abril de 2012

Perdi a hora


Perdi a hora e não peguei teu trem. Só eu sei o quanto corri pra alcançar tua estação. Mas meu tempo não era o teu, por isso perdi a oportunidade de te dizer que aquela não era uma despedida. Perdi a hora. Agora o que eu faço com a tua bagagem? Sim, porque tu deixaste uma parte comigo. Nem sei se era tua intenção, se foi proposital. Mas aqui está, comigo, algo que pertence a ti e, de certa forma, agora pertence a mim também. Perdi a hora e nunca vou saber se tu querias mesmo que eu guardasse tua mala. Abandonada, emprestada, doada? Como tu a deixaste para trás? Me diz logo, rapaz. Volta logo, desce na próxima estação. Não sei. Dá um jeito de emparelhar nossos relógios, de fazer do teu tempo o meu. Mas me diz que isso que tu esqueceste de levar, na verdade, não foi culpa do esquecimento, mas da certeza de que eu sentiria tua falta. Perdi a hora, mas eu sei que nossos ponteiros ainda hão de marcar o mesmo tempo.
"O segredo do tempo é consumi-lo sem percebê-lo." (Paulo Esdras)

sexta-feira, 30 de março de 2012

Sarar


Ei, ela andou pensando, sim. Tem dito por aí que ele era um canalha mesmo, que não passou de uma perda de tempo e juventude, que só a ideia dele embrulhava seu estômago. Mas não é preciso ser terapeuta pra arriscar um diagnóstico. Tudo tentativa de autoconvencimento pós-desilusão. Ah, como ela tem pensado! Vou te dizer: ela ainda não apagou todas as mensagens. Passou algumas noites em claro, lendo todas e forçando a si mesma a apertar o botão. O problema é que, para ela,apagá-las seria como se livrar completamente dos registros do quão bom já foi. 

Ela só precisa de um tempo, mais alguns xingamentos e uma ou outra crise de choro. Depois de todo esse processo inevitável e intransferível, tudo ficará melhor, se assim ela decidir. E eu sei que ela quer melhorar. Sei disso porque decepções amorosas, para uma mente tão lúcida quanto a dela, são um ótimo teste de coerência. E ela é coerente. Mesmo aqueles mais racionais e objetivos precisam de uns tropeços que levem a uma queda livre no romantismo, na idealização. Todos precisam disso vez ou outra. 

Deixe que ela continue falando todas as mentiras, deixe que despeje sua frustração e sua rebeldia crua. Só vai durar mais alguns dias. Ela está sarando. Porque é esse o futuro de feridas abertas: sarar.


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Let's make this happen, girl you gonna show the world that something good can work and it can work for you.
And you know that it will.
(Vamos fazer isso acontecer, garota, você vai mostrar ao mundo que algo de bom pode funcionar e pode funcionar para você.
E você sabe que vai.)
- Something Good Can Work (Two Door Cinema Club)
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Rodas-gigantes


Não sei, existe algo sobre as rodas-gigantes. Algo que não se pode revelar, algo indescritível, tão mágico e íntimo que não se pode destacá-lo sem que perca parte do encanto. Sempre fui muito apaixonada por rodas-gigantes, desde a infância em parques de diversão de pracinha. Se tivesse uma roda-gigante, eu sabia muito bem em qual brinquedo iria por último. É, por último, porque o grand finale é um deleite do qual não me privo.

A sensação de ser tão pequeno quanto você possa se sentir, não como uma constatação de minimalismo, insignificância, mas de individualidade, de importância, por fazer parte de um mundo tão maior que a própria roda-gigante. Eu sempre pensava muito sobre essa noção de ser uma parte (ainda que pequena) de um todo magnífico e infinito. É, pensava nisso enquanto chegava ao topo e balançava os pés pendurados a tantos metros de altura, espiando as pessoas, que, dali de cima, cabiam entre dois dos meus dedos. Ali, no alto, eu podia me sentir maior do que as crianças que corriam lá embaixo, mas jamais seria maior do que o mundo, do que o céu estrelado sobre minha cabeça. A sensação era e ainda é incrível. Existe algo sobre rodas-gigantes, e por mais palavras que venham à mente quando penso sobre isso, nenhuma delas faria jus algum.